Direito de Sucessão

15 abr
  1. Introdução

 

1.1.  Noções conceituais

 

Sucessão vem do latim, sucedere, que significa uns depois dos outros. A sucessão trata do instituto da transmissão, mais especificamente da transmissão causa mortis.

 

O direito à sucessão é garantia constitucional. O ato de suceder é direito da personalidade. A qualidade de sucessor é inegociável. Inobstante, pode ser negociado o direito de receber, efetivamente, a herança.

 

Direito das sucessões é, pois, o complexo de normas e princípios que disciplinam a transmissão do patrimônio de alguém que morreu a seus sucessores.

 

1.2.  Objeto

 

Como visto, ocupa-se o Direito das Sucessões da transmissão mortis causa.

Nem tudo é transmitido, com a morte. As relações personalíssimas se extinguem. Transmitem-se, apenas, as relações jurídicas patrimoniais. O conjunto de relações jurídicas transmitidas recebe o nome de herança.

Herança, segundo o art. 80 do nCC, é bem imóvel e indivisível, ainda que composta, exclusivamente, de bens móveis e divisíveis.

Aberta a sucessão, forma-se um condomínio forçado, que somente é dissolvido com a sentença de partilha. Os herdeiros podem mantê-lo após a sentença. Aí, o condomínio passa a ser voluntário.

Segundo a maior parte da doutrina, se o herdeiro deseja alienar a sua cota parte, deve respeitar o direito de preferência dos demais.

 

Exceção à regra da transmissão é o direito autoral. É o único direito da personalidade que se transmite. A parte patrimonial é transmitida através de um sistema sucessório próprio. Não segue a regra do CC.

Aberta a sucessão, transmite-se aos herdeiros pelo prazo de 70 a partir do primeiro dia do ano subseqüente ao da morte do autor. Findo esse prazo, a obra cai em domínio público.

 

1.3.  Terminologias

 

O Direito das Sucessões possui uma terminologia peculiar.

 

–       Autor da herança: É o falecido. De quem a sucessão se trata.

–       Sucessores: Aqueles que são chamados para continuar as relações jurídicas do falecido. Podem ser a título universal (herdeiro), que concorrem no todo, ou a título singular (legatário), que recebe bem certo e determinado.

–       Herdeiro testamentário: Contemplado em testamento.

–       Herdeiro legítimo: Contemplado na ordem de vocação hereditária. Podem ser necessários ou facultativos.

–       Inventário: Processo judicial tendente a promover a divisão do patrimônio dividido entre os sucessores. Pode ser substituído por arrolamento.

–       Arrolamento tradicional: Dá-se através de transação entre as partes. Pressupõe a capacidade de todos os herdeiros.

–       Arrolamento sumário: Independe do consenso entre os herdeiros. Ocorre quando a totalidade do patrimônio não ultrapassa 2000 OTNs.

–       Herança: Também chamada de acervo, massa ou monte hereditário. É o total do patrimônio transmitido.

 

1.4.  Conteúdo

 

O Direito das Sucessões compreende:

–       Sucessão em geral: Regras aplicáveis a todas as espécies de sucessões.

–       Legítima: Sucessão de acordo com a ordem legal de vocação hereditária.

–       Testamentária: Sucessão de acordo com a vontade do autor da herança.

–       Inventário e partilha.

 

Determinados institutos fogem à regra geral do direito sucessório. Possuem regras sucessórias próprias:

 

–       Direito autoral: Já visto.

–       Bens do estrangeiro: Se situados no Brasil, a sucessão se dá de acordo com a lei mais favorável aos herdeiros brasileiros, conforme determina o art. 10, § 2o, LICC e o art. 5o, XXXI, CF.

–       Enfiteuse: O bem enfitêutico (terreno foreiro) possui sucessão diferenciada. É transmitido livremente. Pode legar, em testamento. Se não houver herdeiros, nem legatários, extingue-se a enfiteuse e a propriedade consolida-se na mão do senhorio.

–       Alvará judicial: De acordo com a lei 6.858/80 e o Decreto 85845/81, a sucessão de pequenos valores monetários dispensa inventário. Independe de recolhimento tributário. Aplica-se a resíduos pecuniários de FGTS, PIS/PASEB, saldos de salários, rescisão trabalhista, depósitos bancários e restituição de Imposto de Renda, em total inferior a 500 OTNs. Os herdeiros podem levantar mediante alvará, sem incidência de tributação. A existência de qualquer bem móvel ou imóvel obsta a concessão de alvará. Os valores devem ir a inventário.

 

  1. Sucessão em geral

 

2.1.  Momento de transmissão

 

Aplica-se o droit de saisene, segundo o qual, transmitem-se, automaticamente, domínio e posse aos herdeiros. No momento da morte, é formado um condomínio forçado.

 

É também nesse momento que é fixada a capacidade sucessória (capacidade para suceder). De acordo com a Súmula 112, do STF, é também o momento em que se estabelece a lei que rege a sucessão. São identificados os herdeiros – somente os que já existiam na data de abertura da sucessão. Há exceções:

–       o nascituro

–       pessoa jurídica constituída com o patrimônio

–       prole eventual.

O nascituro é o já concebido. Prole eventual é o filho que alguém vai ter. Se, no testamento, o autor da herança não estabelece o prazo de espera, o juiz pode determinar.

 

2.2.  Comoriência

 

É a presunção da simultaneidade de óbitos. Não sendo possível determinar, presumem-se simultâneas as mortes. Diz respeito a condições de tempo e não de lugar. Não precisa ser no mesmo evento, nem no mesmo lugar.

 

Admite-se prova em contrário. O ônus é de quem alega. Pode ser alegada e contestada nos mesmos autos do inventário ou em ação autônoma. Nesse último caso, se for matéria de alta indagação.

 

2.3.  Incapacidade sucessória, indignidade e deserdação

 

A incapacidade sucessória obsta que surja o direito à herança. Decorre de:

–       Falta de personalidade;

–       Não encontrar-se na ordem de vocação hereditária ou disposição testamentária.

 

Nos casos de indignidade e deserdação, o sucessor, embora possua esta qualidade, será privado do efetivo recebimento pessoal da herança. Contudo, alguém pode fazê-lo em seu lugar.

 

Já o incapaz de suceder sequer possui a qualidade de sucessor.

 

Segundo o art. 1816 do nCC, os descendentes do excluído (deserdado ou indigno) são chamados a suceder, como se este morto fosse, à época da abertura da sucessão.

 

Deserdação e indignidade são institutos distintos, mas produzem os mesmos efeitos. Ambas são sanções civis impostas ao sucessor que se comportou de forma ignóbil ao autor da herança. Possuem, portanto, finalidade punitiva.

 

A indignidade tem como base a aplicação da sanção dirigida a qualquer herdeiro ou legatário, somente aplicável após a abertura da sucessão. Pressupõe a propositura de ação de indignidade. O Ministério Público não está legitimado a propor essa ação. O interesse em jogo é meramente patrimonial. O prazo prescricional é de 4 anos, a partir da abertura da sucessão. É vedado o reconhecimento incidental de indignidade no inventário.

 

Os motivos ensejadores estão no art. 1814 do nCC:

–       Prática ou tentativa de homicídio doloso: Contra o autor da herança ou seu núcleo familiar. Por se tratar de uma sanção, não se pode fazer interpretação extensiva para incluir a possibilidade de instigação ou auxílio ao suicídio. Não há necessidade de sentença condenatória transitada em julgado. Em caso de decisões contraditórias no cível e no criminal, pode haver modificação, se ainda estiver no prazo da rescisória.

–       Calúnia: Em juízo. Fora dele, qualquer crime contra a honra pode ensejar a indignidade.

–       Violência ou fraude: Para inibir ou obstar a livre disposição dos bens, pelo autor da herança.

Esse rol é taxativo.

 

A deserdação, de seu turno, só atinge os herdeiros necessários. É praticada antes da abertura da sucessão, em disposição de última vontade. As causas são as mesmas da indignidade (art. 1814) mais as dos arts. 1962 e 1963.

Há de se observar que o novo Código apenas se refere às causas de deserdação entre ascendentes e descendentes. Não menciona as causas de deserdação do cônjuge ou companheiro. Por se tratar de sanção, a interpretação deve ser restritiva. Portanto, o cônjuge ou o companheiro não pode ser deserdado.

 

Os efeitos do reconhecimento da indignidade são os mesmos da deserdação. Privam o herdeiro de receber a herança, e seus descendentes herdam como se este fosse morto.

 

A posterior doação ao indigno ou deserdado é perfeitamente possível.

 

A deserdação é irretratável. Há, contudo, hipóteses de perdão, chamadas de reabilitação (art. 1818), aplicável também à indignidade.

 

A causa da deserdação deve ser confirmada em juízo, no inventário, pelos demais interessados.

 

2.4.  Cessão de direitos hereditários

 

Pressupõe instrumento público registrado em cartório de imóveis (a herança é bem imóvel – art. 80). Se o cessionário for casado, requer a outorga do cônjuge, a menos que o regime seja a separação convencional de bens (não a separação obrigatória).

 

A cessão só pode se dar dentro de determinadas circunstâncias. A herança não pode ter sido partilhada definitivamente e deve ter sido aberta a sucessão. A cessão pode ser no todo ou em parte.

 

São características da cessão de herança:

–       Capacidade civil e específica;

–       Sucessão aberta;

–       Anterior ao trânsito em julgado da sentença de partilha;

–       Tem por objeto uma universalidade de bens. Não pode ser um bem específico, salvo se houver expressa anuência de todos os herdeiros. Se um deles for incapaz, deve haver autorização judicial, ouvido o Ministério Público;

–       Respeito ao direito de preferência (art. 1794).

 

Trata-se de negócio jurídico oneroso e aleatório. Pode ser que o cessionário não venha a receber nada. Não se podem alegar os riscos da evicção, nem vícios redibitórios. Gera uma mutação subjetiva no recebimento da herança.

 

2.5.  Aceitação da herança

 

A aceitação tem natureza jurídica confirmatória. Não significa aquisição. É a confirmação da aquisição.

A aquisição ocorre pela transmissão automática. A aceitação produz efeitos retroativos. Ninguém é obrigado a aceitar a herança. É possível renunciá-la.

A aceitação deve ser integral. O Direito Civil brasileiro, em regra, não admite a aceitação parcial. Contudo, se o herdeiro for, a um só tempo, necessário e legatário, pode escolher o título pelo qual sucederá.

 

O ato de aceitação pode ser praticado:

–       Pelo próprio herdeiro ou legatário;

–       Por representante ou assistente do herdeiro;

–       Pelo cônjuge ou companheiro do herdeiro;

–       Pelos herdeiros do herdeiro;

–       Pelo credor do herdeiro, caso em que se limitará ao valor do crédito. O remanescente retorna à massa hereditária.

 

A aceitação não pode se submeter a termo ou condição. É irrevogável. Eventual renúncia posterior produz efeitos ex nunc.

O ato de aceitação traz implicações tributárias.

 

Formas de aceitação:

–       Expressa: É a mais incomum. Se dá por meio de manifestação de vontade, por escrito público ou particular.

–       Tácita: Atos positivos ou negativos que indicam que o herdeiro está aceitando. Ressalva-se a prática de atos meramente oficiosos, que não induzem à aceitação da herança, como funeral, atos de conservação dos bens etc.

–       Presumida: Após 20 dias da abertura da sucessão, sem que o herdeiro tenha manifestado sua aceitação, o interessado pleiteia ao juiz que assinale um prazo de 30 dias para que o herdeiro afirme se aceita ou não. Se o herdeiro quedar-se inerte, trata-se de aceitação presumida.

 

A aceitação é irrevogável e irretratável. É, contudo, anulável.

 

2.6.  Renúncia da herança

 

Consiste no ato de repúdio ao patrimônio que está sendo transmitido. Só pode ser expressa e escrita.

 

Segundo SÍLVIO RODRIGUES, é desnecessária a outorga conjugal. Há controvérsia a respeito.

 

Não se exige homologação judicial da renúncia. O herdeiro deve possuir capacidade geral e específica.

A renúncia obsta a qualidade de herdeiro. Os herdeiros do herdeiro não são chamados em seu lugar.

 

A renúncia abdicativa é o repúdio simples. Já a renúncia translativa é a cessão de direitos travestida de denúncia. Sobre ela incidem dois tributos – ITD e ITIV.

 

A renúncia é irretratável e irrevogável. É possível a anulação. A ação anulatória submete-se ao prazo decadencial de 4 anos.

Na sucessão testamentária, a renúncia caduca o testamento.

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